Um país de casas

A vasta maioria dos domicílios residenciais no Brasil são casas¹. De fato, em apenas 3, das mais de 5000 cidades brasileiras, o número de apartamentos é superior ao número de casas. Isto é, apenas em Santos, Balneário Camboriú e São Caetano do Sul, existe uma proporção maior de apartamentos do que de casas. Embora São Paulo seja famosa por seus prédios, os apartamentos representam apenas um terço das moradias na cidade.

A tabela abaixo resume os dados para as vinte cidade mais “verticalizadas” do Brasil.

Nome Cidade	UF	Casa	Apartamento	Outros	Total Domicílios
Santos	SP	31,9%	67,1%	1,0%	167.478
Balneário Camboriú	SC	36,4%	63,3%	0,3%	57.862
São Caetano do Sul	SP	46,3%	52,5%	1,2%	61.995
Porto Alegre	RS	50,3%	49,6%	0,2%	558.252
Vitória	ES	50,4%	49,0%	0,6%	128.617
São José	SC	53,9%	45,9%	0,2%	105.580
Viçosa	MG	54,8%	45,0%	0,2%	29.055
Florianópolis	SC	55,7%	44,0%	0,3%	219.739
Niterói	RJ	55,8%	44,0%	0,2%	194.492
Itapema	SC	56,2%	43,5%	0,3%	27.423
João Pessoa	PB	58,5%	41,3%	0,2%	296.249
Vila Velha	ES	58,8%	40,8%	0,4%	177.116
Rio de Janeiro	RJ	59,7%	39,5%	0,8%	2.436.971
Valparaíso de Goiás	GO	60,2%	38,9%	0,9%	71.169
Belo Horizonte	MG	60,2%	38,9%	0,9%	889.584
Bento Gonçalves	RS	62,3%	37,7%	0,0%	48.813
Juiz de Fora	MG	62,7%	37,1%	0,2%	210.953
Castelo	ES	64,7%	35,2%	0,1%	14.229
Santo André	SP	64,7%	34,7%	0,6%	280.389
Brasília	DF	64,9%	34,2%	0,9%	988.191

Tamanho do Município

Pode-se imaginar que cidades maiores são mais verticalizadas, na média, do que cidades menores. Isto não parece ser o caso no Brasil. O gráfico abaixo mostra a relação entre o número total de domicílios e o share de apartamentos nas maiores cidades brasileiras. Considerou-se somente cidades com pelo menos 50 mil domicílios (grosso modo, 150 mil habitantes).

Os dados apresentam uma correlação muito fraca e grande variabilidade. De fato, não parece haver relação alguma entre os dados.

A tabela abaixo ilustra este fato. A tabela mostra todas as cidades na faixa de 150 a 200 mil domicílios. A cidade com maior percentual de apartamentos é Santos: 67% dos seus 167 mil domicílios são apartamentos; um contraste enorme com São João de Meriti: menos de 5% dos seus 168 domicílios são apartamentos.

Nome Cidade	UF	Apartamento	Total Domicílios
Santos	SP	67,1%	167.478
Niterói	RJ	44,0%	194.492
Vila Velha	ES	40,8%	177.116
Caxias do Sul	RS	33,9%	184.843
Jundiaí	SP	30,6%	163.219
Maringá	PR	29,1%	156.517
Piracicaba	SP	23,5%	155.428
Mogi das Cruzes	SP	22,3%	158.693
São José do Rio Preto	SP	20,9%	185.633
Serra	ES	20,0%	191.936
Porto Velho	RO	16,2%	151.905
Campos dos Goytacazes	RJ	13,3%	175.744
Ananindeua	PA	12,9%	154.891
Mauá	SP	12,2%	152.619
Aparecida de Goiânia	GO	10,5%	186.221
Belford Roxo	RJ	7,3%	180.893
São João de Meriti	RJ	4,3%	168.771

Comparando o share de apartamentos com o tamanho do município², chega-se na mesma conclusão. O gráfico abaixo mostra o percentual de domicílios contra a área total do município. Seria intuitivo que municípios menores, onde há menos oferta de terra, exibissem maiores percentuais de apartamentos. Contudo, não parece haver relação entre as variáveis.

Na faixa de 450 a 500 hectares, temos 20 municípios, a maioria com menos de 5% de apartamentos. Neste contexto, Balneário Camboriú é um outlier notável com mais de 60% de apartamentos.

Nome Cidade	UF	Apartamento	Total Domicílios	Área (ha.)
Balneário Camboriú	SC	63,3%	57.862	475
Lindóia	SP	23,7%	2.591	495
Cachoeirinha	RS	14,6%	52.484	453
São José da Lapa	MG	10,4%	8.973	480
Harmonia	RS	9,0%	2.022	462
Vale Real	RS	8,5%	2.263	466
São Sebastião de Lagoa de Roça	PB	6,9%	3.764	500
Bandeira do Sul	MG	3,5%	2.232	478
Francisco Morato	SP	3,4%	57.668	498
Santana do São Francisco	SE	1,6%	2.366	453
Mato Leitão	RS	1,3%	1.883	476
Bom Jesus	PB	0,5%	805	475
Ribeirão Vermelho	MG	0,4%	1.470	496
Nova Floresta	PB	0,4%	3.577	477
Chã de Alegria	PE	0,3%	4.384	487
Carmópolis	SE	0,2%	4.689	461
Vila Flor	RN	0,1%	987	477
Belém	AL	0,1%	1.676	489
Palestina	AL	0,0%	1.321	490
Telha	SE	0,0%	1.117	487

Tabela completa

A lista completa dos dados pode ser acessada na tabela abaixo.

Footnotes

Vale notar que os dados refletem o número total de domicílios e não o número total de pessoas morando em domicílios (por tipo de domicílio).↩︎
Existe uma leve distorção no cálculo da área do município. Calculou-se a área total do perímetro municipal, o que penaliza cidades com muitas áreas verdes. Cidades como Campo Grande e Manaus, por exemplo, tem uma área total muito superior à área urbana. Conseguir o shapefile somente da área urbana da cidade, contudo, não é tarefa simples.↩︎

--- title: "Casas e Apartamentos" date: "2024-03-19" description: "Neste post exploro os dados recentes do Censo sobre tipos de domicílios nas cidades brasileiras." categories: ['data-visualization', 'ggplot2', 'real-estate', 'data-science'] format: html: code-tools: true fig-align: "center" execute: message: false warning: false echo: false --- ```{r} knitr::opts_chunk$set(fig.align = "center") library(dplyr) library(tidyr) library(stringr) library(sidrar) library(DT) library(gt) library(gtExtras) library(ggplot2) domi <- get_sidra(6326, variable = 381, geo = "City") domi <- domi |> janitor::clean_names() |> as_tibble() |> select( code_muni = municipio_codigo, municipio, tipo_de_domicilio, qtd = valor ) |> separate( col = "municipio", into = c("name_muni", "abbrev_state"), sep = " - " ) domi <- domi |> mutate( tipo = case_when( tipo_de_domicilio == "Apartamento" ~ "Apartamento", str_detect(tipo_de_domicilio, "^Casa") ~ "Casa", TRUE ~ "Outros" ) ) dat <- domi |> filter(tipo_de_domicilio != "Total") |> summarise( total = sum(qtd, na.rm = TRUE), .by = c("code_muni", "name_muni", "abbrev_state", "tipo") ) |> mutate(share = total / sum(total), .by = "code_muni") tab_geral <- dat |> pivot_wider( id_cols = c("code_muni", "name_muni", "abbrev_state"), names_from = "tipo", values_from = "share" ) |> arrange(desc(Apartamento)) total_houses <- dat %>% summarise(total_houses = sum(total), .by = "code_muni") tab_geral <- left_join(tab_geral, total_houses, by = "code_muni") ``` # Um país de casas A vasta maioria dos domicílios residenciais no Brasil são casas[^1]. De fato, em apenas 3, das mais de 5000 cidades brasileiras, o número de apartamentos é superior ao número de casas. Isto é, apenas em Santos, Balneário Camboriú e São Caetano do Sul, existe uma proporção maior de apartamentos do que de casas. Embora São Paulo seja famosa por seus prédios, os apartamentos representam apenas um terço das moradias na cidade. [^1]: Vale notar que os dados refletem o número total de domicílios e não o número total de pessoas morando em domicílios (por tipo de domicílio). A tabela abaixo resume os dados para as vinte cidade mais "verticalizadas" do Brasil. ```{r} tab_geral %>% select(-code_muni) %>% rename( "Total Domicílios" = "total_houses", "Nome Cidade" = "name_muni", "UF" = "abbrev_state") %>% slice(1:20) %>% gt() %>% fmt_percent(3:5, dec_mark = ",", decimals = 1) %>% fmt_number(6, decimals = 0, sep_mark = ".") %>% gt_theme_538() ``` ## Tamanho do Município Pode-se imaginar que cidades maiores são mais verticalizadas, na média, do que cidades menores. Isto não parece ser o caso no Brasil. O gráfico abaixo mostra a relação entre o número total de domicílios e o share de apartamentos nas maiores cidades brasileiras. Considerou-se somente cidades com pelo menos 50 mil domicílios (grosso modo, 150 mil habitantes). Os dados apresentam uma correlação muito fraca e grande variabilidade. De fato, não parece haver relação alguma entre os dados. ```{r plot-cities-vert} big_cities <- total_houses %>% filter(total_houses > 50000) %>% pull(code_muni) sub <- tab_geral %>% filter(code_muni %in% big_cities) %>% mutate(code_region = factor(str_sub(code_muni, 1, 1))) ggplot(sub, aes(x = log(total_houses), y = Apartamento)) + geom_point(aes(color = code_region)) + geom_smooth( se = FALSE, method = "lm", color = MetBrewer::met.brewer("Hokusai2", 1) ) + scale_y_continuous( breaks = seq(0.1, 0.7, 0.1), labels = scales::label_percent() ) + scale_color_manual( name = "Região", values = MetBrewer::met.brewer("Hokusai1", 5), labels = c("Norte", "Nordeste", "Sudeste", "Sul", "Centro Oeste")) + labs( title = "Verticalização e Tamanho", subtitle = "Relação entre o número total de domicílios e o percentual de apartamentos por cidade", x = "Número total de Domicílios (log)", y = "Percentual de Apartamentos", caption = "Fonte: IBGE (CENSO 2022)") + theme_bw() + theme( panel.grid.minor = element_blank(), legend.position = "bottom" ) ``` A tabela abaixo ilustra este fato. A tabela mostra todas as cidades na faixa de 150 a 200 mil domicílios. A cidade com maior percentual de apartamentos é Santos: 67% dos seus 167 mil domicílios são apartamentos; um contraste enorme com São João de Meriti: menos de 5% dos seus 168 domicílios são apartamentos. ```{r} tab_geral %>% filter(between(total_houses, 150000, 200000)) %>% arrange(desc(Apartamento)) %>% select(name_muni, abbrev_state, Apartamento, total_houses) %>% rename( "Total Domicílios" = "total_houses", "Nome Cidade" = "name_muni", "UF" = "abbrev_state") %>% gt() %>% fmt_percent(3, dec_mark = ",", decimals = 1) %>% fmt_number(4, decimals = 0, sep_mark = ".") %>% gt_theme_538() ``` Comparando o share de apartamentos com o tamanho do município[^2], chega-se na mesma conclusão. O gráfico abaixo mostra o percentual de domicílios contra a área total do município. Seria intuitivo que municípios menores, onde há menos oferta de terra, exibissem maiores percentuais de apartamentos. Contudo, não parece haver relação entre as variáveis. [^2]: Existe uma leve distorção no cálculo da área do município. Calculou-se a área total do perímetro municipal, o que penaliza cidades com muitas áreas verdes. Cidades como Campo Grande e Manaus, por exemplo, tem uma área total muito superior à área urbana. Conseguir o shapefile somente da área urbana da cidade, contudo, não é tarefa simples. ```{r} library(sf) library(geobr) cities <- geobr::read_municipality(showProgress = FALSE) tab_area <- cities %>% st_transform(crs = 31984) %>% mutate(area = st_area(.), area = as.numeric(area) / 1e5) %>% st_drop_geometry() %>% as_tibble() %>% select(code_muni, area_ha = area) %>% mutate(code_muni = as.character(code_muni)) tab_geral <- tab_geral %>% left_join(tab_area, by = "code_muni") ``` ```{r} sub <- tab_geral %>% filter(code_muni %in% big_cities) %>% mutate(code_region = factor(str_sub(code_muni, 1, 1))) ggplot(sub, aes(x = log(area_ha), y = Apartamento)) + geom_point(aes(color = code_region)) + scale_y_continuous( breaks = seq(0.1, 0.7, 0.1), labels = scales::label_percent() ) + scale_color_manual( name = "Região", values = MetBrewer::met.brewer("Hokusai1", 5), labels = c("Norte", "Nordeste", "Sudeste", "Sul", "Centro Oeste")) + labs( title = "Verticalização e Tamanho", subtitle = "Relação entre o número total de domicílios e o percentual de apartamentos por cidade", x = "Tamanho do Município (hectares, escala log)", y = "Percentual de Apartamentos", caption = "Fonte: IBGE (CENSO 2022)") + theme_bw() + theme( panel.grid.minor = element_blank(), legend.position = "bottom" ) ``` Na faixa de 450 a 500 hectares, temos 20 municípios, a maioria com menos de 5% de apartamentos. Neste contexto, Balneário Camboriú é um outlier notável com mais de 60% de apartamentos. ```{r} tab_geral %>% filter(between(area_ha, 450, 500)) %>% arrange(desc(Apartamento)) %>% select(name_muni, abbrev_state, Apartamento, total_houses, area_ha) %>% rename( "Total Domicílios" = "total_houses", "Nome Cidade" = "name_muni", "UF" = "abbrev_state", "Área (ha.)" = "area_ha") %>% gt() %>% fmt_percent(3, dec_mark = ",", decimals = 1) %>% fmt_number(4:5, decimals = 0, sep_mark = ".") %>% gt_theme_538() ``` ## Tabela completa A lista completa dos dados pode ser acessada na tabela abaixo. ```{r} tab_geral %>% rename("Nome Cidade" = name_muni) %>% mutate(across(where(is.numeric), ~round(.x * 100, 2))) %>% datatable() ```